quinta-feira, 11 de fevereiro de 2021

A MESA DOS VAGABUNDOS

Imagem Ilustrativa

 Cássio estava cansado de andar pelas ruas e provar sua masculinidade. Havia dito aos amigos que pararia de fumar e beber no início de todo anoitecer.

- Ah, meu amigo Cássio! Sabes que é incapaz de manter-se com apenas uma donzela. Teu coração é do mundo.

Todos riram, inclusive o protagonista que bebia com um olhar melancólico e distante.

 - Veja bem companheiro, vou lhe contar uma história. A professora de literatura, aquela meio suja, obrigou eu e a todos lerem a descrição absurda de um beijo em um livro que continha poesia. Levantou indignado da cadeira. – Como pode, meus queridos irmãos, eu descrever um beijo?

Cássio retornando ao presente, disse:

- É fácil descrever um beijo irmão.

Todos riram.

 - Estás sóbrio meu amigo? Beba mais, beba. O beijo é beijo. Toque de lábios é toque de lábios. Não existe técnica para beijar. Técnica só no carma do curso de advocacia e logo depois de medicina, que vamos, nós três, estudar. Todas essas infelizes e belas donzelas se apaixonam até com beijos de vagabundos de boca gelada.

- Trata todas as mulheres como se fossem coisa Otávio. Disse Cássio, virando um copo de whisky, encostado na cadeira.

- Estás maluco? Por cada prostíbulo que passou, pensavas eu que tinhas aprendido algo. Levantou outra vez da cadeira. – A loucura da bebida. Perdemos um guerreiro! Perdemos um guerreiro!

- Pare Otávio, olhe as belas moças. Estamos chamando atenção. Disse Cássio, puxando o terno de Otávio. - Não se vá, pigmeu. Ajoelhou-se. – Oh! Pigmeu.

- Estamos só eu, Otávio e tu, Cássio. No meio desta zona existencial, sou o único que tenho controle sobre a bebida. Não estou bêbado... estou anestesiado.

- Pois bem meus amigos, caros colegas de aula e futuros doutores deste Brasil. Heitor e Otávio... Uma princesa roubou meu coração.

Todos ficaram sem palavras, pensando na paspalhada que a bebida fez com o companheiro. Continuaram decidindo escutar o amigo.

- Mesmo não sendo conhecedor de bons tecidos, a pele dela era suave, seus lábios eram aveludados, meus amigos, ao passar a mão em meu rosto, senti a brisa do final de inverno passando pelas camadas de minha pele, aquecendo todas as minhas veias.

Todos riram compulsivamente. Parecia ser não somente, como era a melhor noite antes de partirem para Fortaleza.

- Cássio, és um grande comediante. Seduziria donzelas nos leitos. Agora nos conte a verdade sobre aquela lá... aquela esquecida, sem nome.

O protagonista balançou a cabeça em gesto de negação.

- Pois não é amigos. Estou apaixonado, completamente apaixonado. Meu coração pula do peito. Dispara totalmente.

- Rapaz, pois nos diga, queremos conhecer quem anda com ela. Queremos deste toque aveludado, conhecer outros tecidos. Todos riram, batendo os copos sobre a mesa.

Enquanto isso, a chefia do estabelecimento só observava a diversão dos meninos. Pensava em acabar com a festa, o mesmo estava se divertindo para ser o limitador de felicidade. Mesmo recebendo toques de outras mesas sobre incômodo e barulho, conhecia os pais dos infelizes e não queria confusão.

- Estão empolgados ao extremo. Disse Cássio rindo satisfatoriamente.

- Perdemos um guerreiro! – gritou Otávio.

- Vou contar quem é ela. Se chama...Quem é ela não! O nome... Se chama Aurora.

- Uh! Nome de princesa. Deve estar apaixonado mesmo. Disse Heitor, bebendo em cautelo.

- Existe outra, além dela....

Por algum equívoco do destino, a doce Aurora teve que fazer um desvio em seu caminho. Tinha ocorrido uma tragédia na casa de número terminado em cinco. Não pôde ver, mesmo tentando avistar por cima dos ombros, no meio de tanta gente curiosa. Seria uma novidade para falar ao chegar em casa depois da aula de pintura. Teria que passar pela rua dos vagabundos, às 12:00 horas, já que os policiais interditaram a rua. Estava assustada. Calculou: ocorreu uma tragédia, seu pai estava com o carro parado depois da rua perigosa e uma simbólica borboleta à acompanhava. O que poderia acontecer? Então parou e ouviu uma voz familiar....

- Vou contar quem é ela. Se chama...Quem é ela não! O nome... Se chama... Aurora... Existe outra além dela.

- Quem pigmeu?

- A noite meu jovem, a noite! Todos respiraram aliviados.

- Prometi mundos e fundos para aquela infeliz. Inclusive, marcarei algum encontro romântico para entender mais sobre os tecidos de seu corpo.

Os três amigos brindaram. Ao levantar-se para tirar a paciência da chefia, avistou de longe, Aurora. Estava parada no outro lado da rua, ao lado do que pareciam ser duas borboletas. Assustou-se, porém logo se recompôs, pegou o copo de bebida completa, virou e apontou o dedo ao destino da donzela.

- A infeliz donzela Cássio? Não era mentira? É da noite? Diminuíram os risos. – Aurora! Aurora! Nos apresente suas amigas. Moça! Doce Aurora, não vá, venha cá.

A protagonista correu tristemente ao encontro de seu pai. Já pensara na justificativa do choro para dizer o motivo das lágrimas.

Cássio sentiu a bebida evaporar por todo seu corpo, antes mesmo de acovardasse. Viu a menina e logo perdera. Seu plano fugira de seu controle. Havia perdido Aurora. Sabia que voltaria e a levaria para capital. Estava apaixonado e nunca tinha sido brincadeira. A chefia chegou perto e tocou-lhe o ombro como sinal de pêsames. Cássio havia perdido Aurora por conta de uma noite... Para sempre.

 

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DOCE

 Tu mentes como também oculta pensamentos. Estes deveriam ser meus, e compartilhados a mim que por ti estou, mas não há nada que possa fazer...

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